
Desculpa, mas não encontramos nada.
Desculpa, mas não encontramos nada.
Lendo: Um futuro partilhado no mundo rural
Alargar a escala do planeamento para lá dos proprietários e, no espaço físico, não considerar apenas as culturas agrícolas ou silvo-pastoris, conduz-nos a uma perspectiva ampla e diversificada e a uma implícita escala temporal lenta e resiliente. Isto que contrasta com as opções imediatistas e rentistas da profunda e acelerada transformação da paisagem alentejana pelas monoculturas. Concordas?
De facto, o planeamento da adaptação às alterações climáticas constitui uma oportunidade para repensarmos o presente e o futuro. Ao olhar para a paisagem, temos de ter em mente que temos muitos tipos diferentes de agricultura e floresta, diferentes dimensões de propriedades, presença ou ausência de infra-estruturas de regadio, diferentes condições edafoclimáticas e vários tipos de proprietários − dos que estão presentes a gerir e a trabalhar a terra aos que estão distantes e procuram gerir a sua propriedade pelo «ipad» ou aos que não sabem como ou não têm tempo para a gerir e que por isso a alugam a quem pagar melhor e muitas outras situações…
Pensar de forma participada o futuro da paisagem é, desde logo, um exercício de democracia participativa, pois pressupõe que os proprietários, agricultores e trabalhadores rurais devem gerir a paisagem não apenas com o objectivo de produzir, criar riqueza e gerar emprego, mas também de desempenhar aquilo a que actualmente se chama de serviços de ecossistema e que inclui a prevenção de incêndios, a protecção da biodiversidade, a preservação do equilíbrio do ecossistema e prevenção de pragas e doenças, a manutenção do ciclo da água, a manutenção de um património natural, cultural e histórico, etc.
É portanto absolutamente determinante que consigamos criar uma visão partilhada (e portanto obrigatoriamente participada) para o futuro do território rural das várias regiões do país. Sobre esta visão, vejamos por exemplo a diferença entre a Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas para o sector da Agricultura e Florestas e a Estratégia Nacional para a Internacionalização do Agro-alimentar. A primeira tem como visão «Salvaguardar a capacidade dos espaços agrícolas e florestais proporcionarem os múltiplos bens e serviços que contribuem para o desenvolvimento sustentável do país, reduzindo a vulnerabilidade às alterações climáticas», enquanto a segunda afirma que «Portugal propõe-se alcançar a auto-suficiência, em valor, no sector agro-alimentar até ao ano 2020». Estas visões podem ser complementares ou absolutamente conflituantes. A visão da auto-suficiência em valor pode significar aumentar as exportações para igualarem o valor das importações, mas fazê-lo às custas dos serviços de ecossistema e da sustentabilidade. Ou pode significar o contrário, uma agricultura de maior qualidade, mais diversificada, mais integrada, com uma maior parte dirigida ao mercado interno e aos circuitos curtos agro-alimentares, reduzindo as importações, obtendo na mesmo a auto-suficiência em valor e conseguindo ir mais além, obtendo também maior segurança ambiental, melhor saúde, melhores ecossistemas, mais e melhor emprego, com melhores condições de trabalho (menos agro-tóxicos) e um conjunto de práticas e investimentos pensados para lidar com o aumento da temperatura e a redução da precipitação que, infelizmente e nos cenários climáticos mais prováveis, nos esperam.
O que achas da argumentação do sector agro-industrial da olivicultura, rebatendo as críticas ambientalistas, pela qual o aumento do olival super-intensivo contribuiu para uma maior captura de carbono?
Numa época em que as alterações climáticas se estão a agravar de forma tão significativa, tendemos por vezes a discutir os problemas ambientais apenas em função das emissões de gases de efeito de estufa. Não tendo eu feito as contas sobre as emissões e balanço de CO2 equivalente das monoculturas de larga escala olival, parece-me claro que este não é o seu principal problema ambiental e que devemos olhar para outros aspectos que me parecem bem mais importantes, e são vários.
Em primeiro lugar, as monoculturas de olival intensivo de larga escala aplicam muitos pesticidas e como tal têm um impacto significativo sobre os insectos e as aves à escala da paisagem. Esta mortalidade de insectos e quebra da cadeira alimentar para as aves pode facilmente criar as condições para que um novo ou velho vírus ou bactéria se possa espalhar através da invasão de novas pragas que, por encontrarem um ambiente despido de insectos e aves, se podem facilmente propagar. Diversamente, num ecossistema onde há diversidade de espécies e em que umas se comem às outras, existe uma regulação das pragas.
Devemos portanto, à escala da paisagem, criar limites à expansão das monoculturas. Qual o limite, qual a área que é aceitável, é a pergunta interessante. Para dar a resposta a essa pergunta, poderíamos e deveríamos realizar um estudo de impacte ambiental − mas não só. Idealmente, devemos ponderar os prós e os contras face a uma visão estratégica para o território, que poderia ser desenvolvida de forma participativa e tendo também por base a prossecução dos 17 objectivos do desenvolvimento sustentável, conciliando assim as exportações com a dinamização do mercado interno e da soberania alimentar do país, com a manutenção do equilíbrio dos ecossistemas, da paisagem natural e cultural, da boa integração dos migrantes na região, etc.
Enfim, a questão é como podemos melhorar estas produções para que tenham menor impacte e também qual o valor máximo de hectares que queremos no território e em que localizações. Será que deve ser deixado à iniciativa privada a escolha única desta questão ou existe uma ponderação que deve ser feita para satisfazer a tal visão maior? Parece-me que sim, embora a visão não esteja ainda clara. Por não ter sido criada de forma participativa e integrada, podemos encontrar em diferentes instrumentos estratégicos para o país ou região diferentes orientações contraditórias.
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