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Lendo: Livraria Tigre de Papel

Livraria Tigre de Papel

Livraria Tigre de Papel


A Tigre de Papel abriu em 2016 como livraria independente e espaço de programação regular e diversa.


Mais do que uma livraria para coleccionadores, a Tigre de Papel parece privilegiar livros que são pensados para circular. Esse conceito foi pensado?

Uma decisão que tomámos desde o início foi a de equiparar os livros em segunda mão com os livros novos, seja em termos da selecção ou da sua arrumação na livraria. No início repetíamos bastante a frase de um colega nosso, «os livros não se gastam». Talvez hoje precisasse que são os textos que não se gastam, e que o livro, enquanto meio privilegiado, ainda que não exclusivo, de circulação dos textos tem a vantagem de se fazer ver, de nos sussurrar ao ouvido, de nos gritar na cara, de nos acariciar as mãos. Uma espécie particular de técnica de engate que tanto coloca o leitor no lugar de quem vê como no lugar de quem é visto. Daí que para lá da lógica coleccionista, talvez acrescentasse uma outra, mais interessante e própria do que pode ser o papel de uma livraria: a lógica da composição. Juntar livros relacionando-os de um modo particular é também um modo de ler.

Como chegaram à edição e distribuição?

Começou por ser uma resposta a um interesse particular nosso – a reedição e edição de inéditos da poeta Salette Tavares, com cuja obra sempre tivemos uma proximidade estética forte, bem como a sorte de uma ligação familiar de um dos nossos colegas. É também uma forma de nos relacionarmos com alguns amigos e os seus projectos – por exemplo, o livro A Vida entre Edifícios, do Jan Gehl, que publicámos em parceria com a Cicloficina dos Anjos, ou o livro Gravidez, da Júlia Barata, de quem viemos depois a publicar outros livros. E durante algum tempo as coisas foram sendo um pouco assim, de acolhimento e aproximação a propostas que nos chegavam. Esse modo não desapareceu, mas começámos entretanto a tentar sistematizar um pouco melhor a nossa proposta editorial, e os últimos títulos já reflectem um pouco isso – por exemplo, o livro Habitação Para Além da “Crise”, do Simone Tulumello, que resultou de um desafio feito pela editora ao autor. Quanto à distribuição, foi mais um problema de ordem prática. Como fomos montando um pequeno circuito de distribuição por pequenas livrarias e um método de organização e de logística, a dada altura propusemos a algumas outras pequenas editoras nossas amigas aproveitarmos esse trabalho que já estava feito.

Ao contrário da grande maioria das livrarias independentes, a Tigre de Papel também vende livros escolares. Porquê?

Todo o modelo pedagógico dos manuais escolares precisa de um debate sério… Mas a razão principal para uma livraria como a Tigre de Papel os ter à venda é de natureza sobretudo económica, a que poderíamos acrescentar um papel de assistência às pessoas que são obrigadas a obter os manuais – isto é particularmente relevante para as famílias imigrantes que são confrontadas com um sistema complexo, que ninguém lhes explica, mas a que estão sujeitas se querem colocar os filhos na escola com as mesmas condições das restantes famílias. A razão principal, então, para passarmos três meses do ano agarrados a uma actividade infernal, em que o Estado empilha calhamaços às costas das crianças ao mesmo tempo que alimenta o negócio de empresas privadas, é porque esses três meses permitem um resultado económico que facilita o que fazemos nos restantes nove meses. Digamos que o fazemos com a mesma falta de inocência com que passamos quase três semanas no hipermercado da Feira do Livro de Lisboa.

Se alguém entrar na livraria para comprar o Jornal MAPA, o que lhe propõem para completar o menu?

Por preguiça, com alguma sorte, olho para o lado e topo com Os Cantos de Maldoror, do Conde de Lautréamont, um daqueles aristocratas decadentes da nossa preferência. Talvez sugerisse este livrinho, pela virtuosa intersecção poética, política e existencial que, creio, ressoa na perfeição com a coragem e a loucura de um projecto como o MAPA.

LIVRARIA TIGRE DE PAPEL
RUA DE ARROIOS, 25, LISBOA

 


Artigo publicado no JornalMapa, edição #42, Julho|Setembro 2024.


Written by

Teófilo Fagundes

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