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Lendo: “Desesperar”, Pedro Garcia Olivo

“Desesperar”, Pedro Garcia Olivo

“Desesperar”, Pedro Garcia Olivo


“Desesperar” de Pedro Garcia Olivo Textos Subterrâneos, Abril de 2014

“Desesperar”
de Pedro Garcia Olivo
Textos Subterrâneos, Abril de 2014

“Odiando a modernidade” é o subtítulo que Pedro Garcia Olivo dá a este livro, “Desesperar”, autor que é pela primeira vez traduzido e editado em português. Pedro Garcia Olivo não é um desconhecido por estas bandas, tendo participado na Feira do Livro Anarquista de Lisboa em 2010 ao apresentar dois dos seus livros, “La bala y la escuela” e “El educador mercenario”, que espelham o seu pensamento ultracrítico dos processos de escolarização, leia-se amestramento, e as sua teses antipedagógicas. Mas “Desesperar” não se atém a essa crítica específica que caracteriza a obra de Pedro Garcia Olivo e vai para além disso, fazendo uma censura voraz a diversos aspectos que constituem aquilo que o escritor define como modernidade.

Este livro foi pela primeira vez editado em 2003 no estado espanhol pela extinta Iralka, tendo sido reeditado no princípio deste ano pelo Centro Social Anarquista La Revuelta de Saragoça, facto que tem levado o autor a participar em diversas apresentações pelo estado espanhol. Pode definir-se como uma narração filosófica crítica que parte da experiência pessoal do autor vivendo numa aldeia de alta montanha na região de Valência, o que o leva a confrontar esse mundo rural marginal, como Pedro Garcia Olivo o define, com o mundo dito civilizado, o mundo moderno pedante e a sua ideologia progressista alicerçada na sua própria racionalização. E o desespero é o conceito filosófico com o qual o autor sublinha a sua crítica: desespero não no sentido moderno do mesmo, sinónimo adulterado de angústia, temor, sofrimento, aflição, desânimo, mas um simples deixar de esperar.  Pedro Garcia Olivo descobre nesse outro mundo, até ao qual não se estendem auto-estradas e comboios de alta velocidade, um mundo antagónico daquele dos grandes espaços urbanos, dos centros comerciais, do turismo de fim-de-semana, um mundo diferente, não tocado ainda pela estulta mão de Midas que tudo quer transformar em “ouro”, um mundo marginal e talvez incompreensível para a mente formatada pela ratio moderna. Um mundo em que nos adentramos através de uma personagem real, Basilio, um pastor de alta montanha analfabeto, que vive completamente fora dos cânones modernos da nossa razão, chegando a ser insultuosa para esta a forma como consegue viver a sua liberdade e autonomia completamente alheado das teias do estado.

Depois de lido, pode-se considerar “Desesperar” um manual do desnudamento. Se a esperança é um véu com que nos tentamos proteger das intempéries da existência e que de alguma forma dá formas fantásticas e ilusórias à realidade, velando-a, desesperar é um destapar abrupto desse véu lançado pelos produtos da razão moderna que nos deixa desprotegidos e nus perante essa realidade árida que é o deixar de esperar. A esperança, para Pedro Garcia Olivo, é uma ilusão com que nos alimentamos, brandindo a nossa fé no porvir, e que de alguma forma perpetua o mundo tal qual ele existe. Deixar de esperar seria então um acto niilista, uma negação do existente, não para a construção de um novo edifício que pudesse suportar uma fé, mas para a destruição completa de todos os edifícios construídos pela razão moderna. Para assim podermos voltar ao mundo primordial de Basilio, um mundo que, infelizmente, teremos deixado de compreender.

 P.M.

 


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Jornal Mapa

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