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Lendo: Incêndios: depois do luto, a luta

Incêndios: depois do luto, a luta

Incêndios: depois do luto, a luta


Aproxima-se o equinócio de outono, fim do verão, e o país está em cinzas, com a maior área ardida desde de que há registo. No próximo fim de semana de 20 e 21 de setembro, dezenas de protestos e iniciativas auto-organizadas deflagram por todo o país: contra os fogos florestais, em defesa das serras e das florestas, e por uma transformação de fundo no território.

No dia 20, a rede Emergência Florestal/Floresta do Futuro está a mobilizar a população para realizar protestos pelo país, sob o lema «Deseucaliptar, Descarbonizar, Democratizar». Dia 21, todos os caminhos vão dar à Torre, na Serra da Estrela: o movimento “Por Serras Dignas” convida a um “momento apartidário de encontro e partilha, em defesa da Serra, do território e das comunidades que aqui vivem.”

“As serras, florestas, animais, rios e pessoas serranas merecem um futuro de esperança que pede resistência em cada aldeia, em cada trilho, em cada ecossistema”, afirma-se no manifesto “Por Serras Dignas!”. “É urgente um sobressalto popular e cidadão», lê-se no comunicado da rede Floresta do Futuro.

“A situação que se vive atualmente é completamente fora do aceitável e do razoável e é preciso atuar”, disse à Lusa, em meados de Agosto, um dos elementos da rede, João Camargo. O movimento falava numa «convergência de fatores catastróficos», criticando a «escolha reiterada de entrega do mundo rural ao abandono e à eucaliptização», no «país que mais arde da União Europeia».

«Em termos relativos, é o país com mais área de eucalipto no mundo. O país com menor área pública florestal da Europa. Disto resultam lucros recorde para a indústria da celulose», acusava a rede.

Localidades como Arganil, Braga, Coimbra, Lisboa, Lousã, Odemira, Oliveira do Hospital, Pedrógão Grande, Ponte da Barca, Porto, São Pedro do Sul, Sertã e Valongo do Vouga já confirmaram adesão ao protesto de dia 20, podendo juntar-se uma dezena de outras.

Fernando Amaral, antropólogo que foi vítima dos incêndios de 2017, um dos porta-vozes do movimento, é perentório: «Precisamos que a população não caia no torpor de aceitar que os incêndios são inevitáveis (…): vivemos num interior cada vez mais abandonado, cada vez mais cheio de espécies perigosas como eucaliptos e acácias, que aceleram e espalham os fogos, e cada vez mais quente. Não podemos resolver isto com mudanças superficiais nas estruturas de combate aos incêndios nem podemos deixar que nos virem uns contra os outros. Precisamos de mudar para uma floresta autóctone e resiliente, mudar a estrutura da propriedade e travar a subida da temperatura».

Ainda segundo Fernando Amaral, «nos últimos 35 anos, já ardeu o equivalente a metade do território nacional. Para podermos ter uma terra onde possamos viver sem medo, temos que organizar a mobilização popular que a política nunca quis nem aceita. Para podermos ter um futuro, temos de construí-lo com as nossas mãos. Dia 20 será apenas o primeiro dia. Dia 21 continuaremos a construir as redes e as pontes que precisamos para sobrevivermos enquanto sociedade».

“O sofrimento dos incêndios abriu feridas antigas, fez lembrar décadas de abandono, de decisões tomadas longe daqui, de promessas nunca cumpridas. As chamas deixaram um rasto de tristeza, mas revelaram também algo que nunca se perdeu: a força de comunidades que sabem unir-se e resistir”, afirmam as organizações que convocam a concentração “Por Serras Dignas”.

“No dia 21 de setembro, às 11h00, subimos à Torre de todos os lados da montanha para afirmar o direito de viver aqui. Queremos serras dignas para todos os seres vivos que aqui habitam! A montanha une.”

A proposta é um momento de encontro e convívio, “para dar voz à dor e transformar a revolta em esperança”, criar “laços e cooperação entre entidades vizinhas” e lançar as bases para um movimento comum em defesa do futuro das serras da Estrela, da Gardunha e do Açor.

“A montanha não é apenas pedra e vegetação, nem paisagem para turismo fugaz, nem reserva de sacrifício para monoculturas e políticas que vêm de longe. É casa de muitos seres vivos, é trabalho, muitas culturas, escola, futuro! Queremos florestas vivas e diversas, ordenamento regenerativo, biodiversidade, água limpa, empregos dignos, culturas vivas, transportes e casas acessíveis, uma economia que valorize quem cuida e quem permanece. As serras são bens comuns a defender com e para todas as pessoas.”

Antes, neste domingo, dia 14, tem lugar em Santiago de Compostela, Galiza, um grande protesto convocado pela rede ‘Por un Monte Galego con Futuro’, que agrupa 62 organizações sociais, sindicais e ecologistas.


Foto de destaque: intervenção regenerativa pós incêndio numa ajudada promovida pela associação Ação Floresta Viva

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