Desculpa, mas não encontramos nada.
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Lendo: Vida justa, gritou a periferia de Lisboa
Jornal MAPA: Como é que a manifestação por uma vida justa, uma iniciativa que nasce nos bairros, faz dos habitantes da periferia um colectivo com reivindicações próprias? E que reivindicações são essas?
Sinho: Em relação à manifestação, desta vez nós sentimos que o bairro se organizou e que fez por tudo para que a voz do bairro fosse ouvida, e para que as medidas concretas que o bairro pede fossem reivindicadas e faladas. Ficámos contentes mas não ficámos ainda satisfeitos, enquanto não se cumprirem as medidas que foram exigidas por cerca de 2000 pessoas – e por outras pessoas que não puderam ir, por factores de trabalho, localização, transportes ou segregação. Mas queremos fazer parte da decisão. As nossas reivindicações são combater a inflação, combater os despejos e combater as rendas altas nos bairros sociais. Sabemos que temos uma sociedade precária de classe média/baixa, mas também temos a periferia, onde as medidas, mesmo que sejam implantadas para a sociedade em geral, não fazem efeito. Por isso, há medidas que têm de ser faladas por nós. Temos de fazer parte da decisão para tentar colmatar principalmente a situação da habitação, da saúde, da documentação, da violência policial, dos transportes (que, na periferia, são várias vezes suprimidos) e outras situações que prejudicam mais as pessoas no dia-a-dia.
JM: Sentes que a presença dos partidos da esquerda parlamentar, do PCP e do BE em particular, retirou o protagonismo à auto-organização dos habitantes e organizações dos bairros?
S: Eu estava na cabeça da manifestação e não senti presença de nenhum partido em particular. Vi pessoas que podem ser militantes de vários partidos e outras que não têm partido. Mas nós que estávamos na linha da frente estávamos coordenados e não nos sentimos beliscados por nenhum partido. Quem estava lá estava em nome próprio. E até estava o Presidente da República, portanto não é por aí… Se estavam lá partidos, eu espero que assumam estes problemas, porque há situações que certos partidos nem subscrevem, como o racismo – há partidos em Portugal que não tocam nessa temática, o que se vive nas periferias e nas comunidades racializadas.
JM: Como se tem reflectido este activismo dos bairros no trabalho e na tua vivência comunitária?
S: Eu não chamo isto de activismo, porque nós não somos activistas, somos a classe trabalhadora precária com os movimentos associativos que fazem o trabalho social, cultural, de educação e de esclarecimento. Sentimos que somos cidadãos que querem que algo mude, somos os movimentos associativos e as comissões de moradores que querem contribuir com a sua voz e experiência para as medidas públicas que afectam as suas comunidades, que querem estar em consonância com as Juntas de Freguesia e a Câmara Municipal para resolver certas coisas, porque sabemos que podemos ajudar e fazer parte do processo. A organização é estarmos em rede – pessoas, movimentos e associações – e partilhar experiências. Foram várias comunidades que se juntaram para fazer o movimento «vida justa», mas é trabalho que se está a fazer há muito tempo, só que não está a ser valorizado nem credibilizado. Mas acredito que com a rede de apoio mútuo, sob o conceito nu sta djunto, nu sta forte (estamos juntos, estamos fortes), se houver compromisso das pessoas, pouco a pouco chegamos lá.
Artigo publicado no JornalMapa, edição #37, Março|Maio 2023.
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