Desculpa, mas não encontramos nada.
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Lendo: Contra a Reintoxicação do Mundo
Entre a Covid-19 e a loucura do ecocídio, um apelo chegou-nos de França para uma série de ações, bloqueios, encontros e ocupações para enfrentar os lugares «mais evidentemente venenosos e dispensáveis: cimenteiras, fábricas de pesticidas ou produção de gás e granadas da polícia, indústria aeronáutica, publicitária ou de construção de plataformas Amazon, unidades de criação industrial, desenvolvimentos da indústria nuclear…»
Depois de um ano na vida do planeta decorrido sob o signo da pandemia, sabemos que o fique em casa serviu igualmente para tentar confinar quem nas ruas e nos campos protestava e defendia a nossa casa comum. Sem que neste tempo todo fossem postas em «modo de pausa» as constantes ameaças que, ao longo dos anos, levaram aldeias, cidades, comunidades e populações a erguer-se em defesa da sua casa. Verdadeiros territórios em luta enfrentando os mais diversificados projetos destrutivos, essencialmente extrativistas, e com graves consequências ambientais e sociais. Mas este «novo normal» não significou a paralisia dos movimentos sociais, tal como nos relatam os acontecimentos a partir de França.
Para o próximo dia 17 de Abril, «uma constelação de sindicalistas, camponeses, zonas a defender (ZAD), associações, territórios em lutas, espaços autogeridos e cooperativas decidiram lançar um apelo comum» por toda a França para uma «terceira vaga de ações contra a reintoxicação do mundo». A ideia é repetir a vaga de ações do ano passado, quando em plena pandemia, em 17 de junho e 17 de novembro de 2020, ocorreu «uma ronda de ações, bloqueios, encontros e ocupações contra locais de produção, estaleiros, projetos e infraestruturas tóxicas».
Um novo fôlego das lutas no terreno face à dramática expansão da crise ecológica e ao cinismo patente dos “nossos dirigentes”
A plataforma, onde se coordenam à presente data mais de uma centena de coletivos de toda a França, recorda como «em maio do ano passado, à saída do primeiro confinamento, enquanto a máquina económica e produtivista voltava a disparar, um apelo para agir contra a reintoxicação do mundo foi lançado e seguido por dezenas de grupos em todo o país. Em 17 de junho, mais de 70 ações, ocupações, bloqueios espalharam-se simultaneamente. Desde então, constituíram-se coletivos, resistências acordaram, projetos destrutivos foram parados. Este dia materializou um novo fôlego das lutas no terreno face à dramática expansão da crise ecológica e ao cinismo patente dos “nossos dirigentes”».
Um segundo momento de mobilização aconteceu «no passado dia 17 de Novembro , onde, apesar dos obstáculos e proibições, mobilizações nos quatro cantos do país conseguiram furar os muros do confinamento». Agora, uma vez mais, essa constelação de redes, organizações e espaços envolvidos «na “dinâmica dos 17”, decidiu fazer um apelo comum para um novo dia de ações no sábado, 17 de abril».
Estas lutas fazem parte de um vasto e diversificado movimento de lutas nos últimos anos, permitindo desenhar «um mapa de locais de produção destrutivos que devem parar, de meios naturais — florestas, zonas húmidas, terras aráveis — que devem ser preservados, de projetos sem sentido que terão de ser abandonados… Sabemos que isso exigirá regressar regularmente a todos estes lugares, habitar alguns deles, continuar a coordenar-se e lançar novas vagas de mobilização ainda mais amplas e determinadas. Só assim conseguiremos manter as condições de existência possíveis e desejáveis para nós e para o resto da vida, fora do niilismo mercantil».
Por isso, o apelo de 17 de Abril aborda a era Covid-19. «Enquanto o mundo moderno parece ancorar-se num estado de semiconfinamento permanente, a ligação entre o Covid-19 e a loucura do ecocídio já está patente, as empresas privadas parecem estar prontas para prosseguir o envenenamento do mundo até ao seu último suspiro. Enquanto as alavancas para criar obstáculos à devastação dos ambientes vivos são encravadas pela virtualização geral, o governo francês propõe criminalizar os novos movimentos ecologistas e insiste em impor à força a Lei de Segurança Global. Numa sequência histórica em que todas as políticas afirmam ser guiadas pela urgência sanitária, a França e os países vizinhos prosseguem a exportação de pesticidas proibidos no seu próprio solo, que envenenam gravemente cerca de 400 milhões de pessoas por ano noutros continentes. Apesar dos estudos oficiais sobre o seu carácter climaticida, das declarações municipais e das ações diretas para a travar, a implantação da 5G nos nossos territórios aumenta ainda mais a nossa dependência dos ecrãs. No entanto, a digitalização das existências, reforçada pela era Covid-19, traz consigo uma perda depressiva das ligações, da relação com a terra e com a vida. É nestas bolhas que as novas gerações crescerão se não assegurarmos que o mundo volte a respirar».
Perante este cenário e «sem esperar pelo levantamento da emergência sanitária, resistências locais nascem do espírito da época e dos seus gritos de alerta. O movimento Stop Amazon desenvolve-se nos quatro cantos do país contra a implantação de novos armazéns, símbolos da distopia moderna. Em Gonesse, nasce uma nova ZAD contra a artificialização das terras férteis que ainda fazem fronteira com a “Grande Paris”. Em Marselha, um McDonald’s foi transformado em lugar de solidariedade e de redistribuição de alimentos pelos seus antigos assalariados. Em torno da refinaria de petróleo de Grandpuits (Normandia), militantes ecologistas e sindicalistas em greve aliam-se para denunciar o greewashing da multinacional Total. Eles recordam-nos a urgência de pensar — com os trabalhadores dos setores mais tóxicos e face aos que enriquecem cada vez mais à sua custa — as mutações possíveis das actividades, as reapropriações dos locais de trabalho, bem como as lutas a empreender para garantir recursos e direitos durante os períodos de transição.»
A digitalização das existências, reforçada pela era Covid-19, traz consigo uma perda depressiva das ligações, da relação com a terra e com a vida. É nestas bolhas que as novas gerações crescerão se não assegurarmos que o mundo volte a respirar
O apelo de 17 de abril em França ultrapassa, no seu espírito, a data e as fronteiras e acontece igualmente coincidir 17 de abril com o Dia Internacional das Lutas Camponesas, data que se celebra desde há 25 anos. Na defesa da necessidade de preservar terras para uma agricultura que cuide da vida, os coletivos signatários da convocatória afirmam que «se falamos a sério quando afirmamos que queremos abandonar amplas partes do mundo mercantil, temos de construir formas de autonomia capazes de responder às nossas necessidades fundamentais. Assim, apelamos também a ocupações de terras nas cidades ou nas zonas periurbanas para projetos agrícolas, mas também à requisição de espaços de entreajuda, de cuidados, de redistribuição e criação. Não haverá “viragem” sem que se construam, aqui e agora, formas de vida com mais sentido e muito mais desejáveis do que as determinadas pelas necessidades do mercado.»
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