
Desculpa, mas não encontramos nada.
Desculpa, mas não encontramos nada.
Lendo: Como é bom viver em festa!
A edição limitada (300 ex.) do CD «Viver / Festa» de C.O.M.A. (16 temas) está disponível por 5€ para assinaturas@jornalmapa.pt ou musica@jornalmapa.pt.
No ano de 1998, o Fips instalava em casa um software de som, o Saw Plus, na altura coisa rara. André escrevia algumas letras e embora não sendo um Mc, assim se foi tornando através de eximias rimas e spokenword sob beats que não se encontram datados, ainda que lá esteja o trip hop dos anos 90. Fips recorda como «as maiores referêncas que possamos afunilar o Anarquismo e a forma de estar do punk, o Linton Kwesi Johnson, os Portishead e os Micro”, estes últimos ali mesmo de Carcavelos. Como André recorda, «num contexto de grande envolvimento com outros projectos alternativos, fomos mostrando as músicas a amigos, ganhando confiança, convidando outras pessoas a participar, na ideia de construção de um colectivo aberto a todos/as os que quisessem contribuir com letras, beats, textos, grafismos».
Nascia o Colectivo Ontológico e Musical «os Amigos». Os C.O.M.A. Hip Hop experimentado nos quartos, «letras e microfones de forma rudimentar, tripés em paus de vassoura, numa altura em que fazer música caseira não era um privilégio, era mesmo muito à frente. Uma tentativa de colectivo que reunia uma grupeta de juventude politizada, alcoolizada e algo mais, do Extra de Carcavelos.»
Parte dessa grupeta reuniu-se agora para reeditar a k7 editada em 1999. «300 unidades caseiras vendidas, acompanhadas de uma zine que mais do que booklet, era mesmo uma zine». Fazem parte das editoras Anticorpos, que chancela a edição, Rebeldes Vagabundos do Haxixe e da Mamut Music. Reverter as vendas para o Jornal MAPA nasce das afinidades anarcopunks com largos anos e pretende vir a inaugurar uma linha de edições musicais em torno do Jornal. Em que a música tal como a informação é critica e actuante.
Na actualidade é na Mamut Music que acabaram por convergir os dois esteios de C.O.M.A., André e Fips. «A fazer estrada, produção e agenciamento num meio profissional, mas a trabalhar por afinidades, com o pé no chão e o coração no sítio certo e que nos fez estar ligados a coisas tão lindas como Octa Push, Karlon, Batida, Freddy Locks, McK, IKOQWE, Meu Kamba Sound, entre muitos outros». Para eles a música esteve sempre presente. Dos tempos de C.O.M.A. havia Lôv Da Xit, Crise Social, Xitobula, 20 Pas 8. Houve depois Nsekt, Zootic, Cão, Da Galangs.
«Reggae, Punk, Noise, de tudo um pouco e um enervante sangue nas guelras. Uma raiva diária, uma imaginação que não parava, que se exprimia na rua, nas salas de ensaio, em casas que se ocupavam, zines, concertos, confrontos constantes numa estação de comboio perto de si. Um grupo de gente que se formou na amizade, mas também na solidariedade, camaradagem, revolta, insubmissão, cooperação, no sonho da autogestão».
Assim descreve-nos André essa «tentativa de Colectivo Musical, que não deixou de reunir os seres mais improváveis, mas que não tiverem vergonha de mandar umas “larachas”. E que nunca esteve fechado, como nada na nossa vida. Libertários. O mundo era o Hard Core, das tours em Espanha das nossas bandas, o reggae no B-Leza, rap nas Marianas, as sessões de amável diálogo com a bófia de Cascais, com os amigos do Fim do Mundo a dar-nos uma ajuda na festa. Ajudar a ocupar casas com gente que não tinha lido as cartilhas, mas percebia que podia haver vida por aquele caminho. Uma enervante inquietude que nos fazia saber que o mundo era nosso».
Foi esse o ambiente que proporcionou as sessões experimentais, sempre caseiras, de C.O.M.A. Um «DIY, antes do trendy. Mais de 300 K7´s amarelas e verdes que se venderam de mão em mão, da Casa Ocupada da Praça de Espanha aos No Name e Juve Leo de São João. Tentar espalhar e chegar a todo o lado, para semear e crescer. Sem bazófia. Com muita vontade».
Estão, sem qualquer drama, cientes que «falhou muito nesta tentativa de construção de um Colectivo. Musical. Porque não conseguimos alargar e incluir mais gente. Ainda assim respirou-se até 2004, com mais vozes e mãos mágicas. E estava tudo lá. Do construir música fora da caixa, numa altura em que o mercado era um monstro. As letras da ingenuidade de quem se construía como individuo consciente e politizado. Libertários. Pôr em causa a construção de uma sexualidade que nos impunham e de como acreditávamos que podia ter muitas formas. A raiva a uma esquerda, que ainda não era caviar, mas já gostava de falinhas mansas. E calma, sempre a pedir-nos calma. Testemunhar o racismo quotidiano, de que muitos do que nos eram próximos, eram vítimas. Às coisas mais quotidianas, como levar nos cornos “por dá cá aquela palha” de um bófia a tresandar a cavaquismo bafiento e ainda com resquícios da velha senhora. Querer fumar em paz. Ou mais uma cegada com carecas, numa época que anti-fa não era um post pertinente no Twitter».
Dos temas que surgiram depois de 1999 há felizmente a chama acesa de virem à luz do dia e das noites. Mais ainda, «estão novos temas no forno, veremos se sentimos que têm a qualidade suficiente para saírem. Andamos sempre aí, isso é certo».
Porque sublinhe-se não há a decadência do revival nesta reedição. Como afirma André, «garanto que não era uma idade. Continuamos a escrever. Continuamos a produzir e fazer música. Todos os outros continuam por aí. Já tivemos filhos e entalámo-nos um bocado. Mas esta enervante raiva que nos corre nas veias, continua por aqui. Nunca o mundo como o sonhámos, deixámos de o sonhar. Nunca as lutas deste passado, fizeram hoje tanto sentido. Nunca todas as crianças que temos dentro de nós, nos gritaram tão alto: como é bom viver em festa!».
A ediçã0 limitada (300 ex.) do Cd Viver/Festa de C.O.M.A. (16 temas) está já disponível em pré-venda (5€) para os assinantes do jornal MAPA ou novos assinantes:
Artigo publicado no Jornal MAPA, edição #30, Março | Maio 2021.
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